As Aventuras de Nando & Pezão

"Rock na Veia"

Capítulo 5 – Carrapato

— Já imaginou se vocês fizerem sucesso??? Não vai se esquecer de mim, hein!

— Pode deixar.

— Porra, Nando, tive uma idéia, deixa eu entrar para a banda de vocês?

— E você sabe tocar algum instrumento?

— Sim, eu toco gaita.

Era só o que me faltava. To fodido, ou melhor, to cagaita.

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Na manhã seguinte....

Rrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrring!!!! Como sempre, o maldito telefone. Nem preciso de IFDP (Identificador de Filho-da-Puta). Você e eu já sabemos quem é. Mas hoje vou atender de outra forma. Saca só:

— Funerária Sr. Muniz, onde sua morte nos deixa feliz. Bom dia, em que posso ajudá-lo?

— Nando, é você, né? Caralho, quem lhe contou?

— Hã? Quem me contou o quê?

— Sobre o Rufos.

— O que tem o Rufos?

— Ele morreu ontem. Não foi por isso que você falou "Funerária Sr. Muniz" ?

— Não, nada a ver. Mas o coitado morreu mesmo? Sacanagem.

— Sacanagem. Morreu morrido mesmo. Está morto. Bateu com a cachuleta.

Ah, vocês não sabem quem é o Rufos. Bom, também não vou contar. Fica mais um segredo entre nós ... pode ser? Hehehe.... Brincadeirinha... brincadeirinha... De segredo já basta Ubatuba, né? Mas reparem bem... de pouco em pouco eu estou revelando alguns detalhes sobre a tragédia de Ubatuba ... quem é esperto já percebeu isso. Junte todas as dicas que eu deixei até agora e você vai ver que já dá pra montar alguma coisa. Ah, eu enrolei e não contei quem é, ou melhor, quem foi Rufos. Rufos era o Pitbull do Pezão. Rufos era um maldito Pitbull obeso que não fazia absolutamente nada o dia inteiro, igual o dono. O ladrão poderia entrar, abaixar a calça e mostrar o bundão branco e cabeludo para o nosso amigo Rufos... e nada aconteceria. Rufos, na pior das hipóteses, levantaria aquela cara gorda do chão e emitiria um lerdo bocejar, deixando cair sua baba nojenta. Rufos era a vergonha da raça. Se algum dia os Pitbulls se reunissem para fazer uma convenção... Rufos seria deserdado. Mas é claro que os Pitbulls teriam de vir até a casa do Pezão para dar a notícia, visto que Rufos certamente nem teria ido à convenção, por preguiça. Pelo menos, Pitbicha ele não era, porque pra ser Pitbicha ele teria de dar o cu, e nem pra dar o cu ele servia. Rufos só se levantava pra comer ou pra largar suas fezes fedorentas pelo quintal. Rufos era o cachorro mais esquisito que eu já vi em toda a minha vida. Só para vocês terem uma idéia, a maioria dos cães morrem de medo de barulho de trovão e fogos de artifício, certo? Bom, pelo menos os cães normais que eu conheci morriam de medo disso. Rufos não. Eu acho que ele até gostava. Rufos só tinha medo de uma coisa, pessoas usando óculos escuros. O pobre coitado se borrava todo. Ele não latia nem nada, ficava estático, em transe. Pobre cachorro gordo e esquisito dos infernos. Descanse em Paz.

— O coitado morreu do quê? — perguntei.

— Assistindo DVD comigo.

— Como é que pode isso?

— A culpa foi minha. Aluguei Matrix Reloaded.

Puuuuuuuuuuuuuuuta que o pariu!!!!! Pobre Rufos.

— Eu acho que ele morreu logo no comecinho do filme, mas eu nem percebi. Quando o filme chegou ao final ele já estava fedendo carniça. Pobre Rufos.

— Ah, a culpa foi sua mesmo, mas não se culpe. O filho da mãe morreria de ataque cardíaco a qualquer momento mesmo.

— É verdade.

Ficamos em silêncio. Emiti um longo bocejar... está cedo ainda, 10 da manhã!!!

— Liguei pra falar outra coisa. — disse ele, após uma longa pausa.

— Porra, nem vem que não tem, não vou aí pra ajudar a enterrar o desgraçado.

— Vai se ferrar, Nando. Pra início de conversa o corpo do Rufos já se foi.

— Você já o enterrou?

— Não enterrei.

— Não?

— Não. Eu doei.

— O quê???? Doou pra quem?

— Passaram uns mendigos pedindo comida. Eu dei o Rufos.

— Você enlouqueceu??? Puta merda, você não está falando sério.

— Estou sim. Enlouqueci por quê? Calma, você não ouviu tudo. Eu não dei só o Rufos, arranjei carvão e uns fósforos pro pessoal. Deu pra sentir o cheirinho de churrasco daqui do meu quarto até.

Puta merda, não sei se desligo o telefone ou saio correndo pra vomitar.

— Nando, você ainda está aí? O que houve? Fala alguma coisa, porra!

— Quando você morrer eu tenho pena da sua alma, Pezão. Puta que o pariu, você vai arder no fogo do inferno. Ah, vai sim.

O filho da mãe começou a rir feito uma hiena com conjuntivite.

— Por quê? — perguntou ele, na maior cara-de-pau. — Organizei um puta churrascão para os mendigos do bairro. Fiz uma boa ação. Só não providenciei a cervejinha e o pagode, mas aí já seria demais, né?

— Cara, eu não sei como eu perco tempo com você. Fala logo o que você queria falar e me deixa voltar a dormir!!!!!

— Dormir? Seu bosta, esqueceu que hoje será o nosso primeiro ensaio?

— Porra, é mesmo. Ah, falando em ensaio... tem gente querendo fazer parte da nossa banda.

— Quem?

— Adivinha.

— Vou adivinhar porra nenhuma! Não sou a Mãe Dinah. Fala logo!

— Só uma dica: quem chegou de viagem ontem?

— Puuuuuuuuuuuuuuuuta merda!!! Nem vem que não tem. O veadão?

— Sim, ele quer tocar junto com a gente.

— Tocar? Mas tocar o quê? A única coisa que ele deve tocar é punheta, e usando o bilau dos outros ainda. Putz!

— Porra, Pezão! Larga mão de ser idiota. O cara toca gaita.

— Depois dessa notícia eu também to cagado.

— Não, eu disse que ele to..ca ... gaita.

— Gaita? Mas que porra de banda tem gaita?

— Sei lá, acho que música country tem gaita.

— Caso encerrado então. Nossa banda é de rock, não é de country. Fala pra ele.

— Calma, não é assim. Deixa que eu vou dar um jeito.

— Porra, agora só falta você arranjar uma bicha que toca flauta, aí a gente monta uma banda gay pra tocar musiquinhas floridas no bosque aos domingos. Ah, puta merda! Era só o que me faltava!

— Pezão.

— Fala.

— Enfia o dedo no cu e morre!!!

— E você pega a gaita do seu primo e...

Bati o telefone na cara do filho da mãe. Mas eu sei que ele vai ligar novamente.

Rrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrring!!!! 

Não falei? Conheço a peste.

— Não se esqueça. — disse ele. — Marquei com a galera, vamos nos reunir aqui em casa às duas da tarde.

— Certo.

— E dá um toque na biba aí, nada de gaita.

— Deixa que eu me viro.

— É mesmo? Vai se virar, é? Hummmmmm....

— Vai se foder.

Desliguei o telefone novamente. Maldito Pezão do caralho, o desgraçado consegue me deixar irritado logo cedo.

De repente a porta do meu quarto se abriu e o clarão do dia invadiu os quatro cantos. Quase fiquei cego.

— Acorda, primo! — Era o maldito primo Jaime.

Hoje eu dormi de bermuda. Geralmente eu durmo peladaço, mas aí eu durmo com a porta do quarto fechada, é claro.

— O que você quer? — perguntei, limpando meus olhos remelentos.

— Eu não agüento mais falar com a tia.

— Minha mãe também está pegando no seu pé? Que bom, talvez assim ela pare de pegar no meu.

— Você vai me perdoar, Nando, mas sua mãe é muito chata.

— Por quê? O que ela fez pra você?

— Ela tem um preconceito enrustido dentro dela, e não admite.

— Como assim?

— Sua mãe é igual o comercial da Nova Schin.

Putz! Só me faltava essa.

— Hã?

— Ela dá a impressão de que aceita a minha homossexualidade, mas no fundo eu sei que ela está louquinha pra me dizer... "Meu sobrinho, por quê você não tenta namorar uma menina? Experimenta! Experimenta! Experimenta!".

Puuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuta que o pariu!!!!! Hahahaha..... Fazia tempo que eu não ria tanto. A última vez que eu ri desta forma foi há duas semanas, quando o Pezão foi tentar se fazer de gostosão para uma mina em frente ao supermercado. A garota estava num carro novinho, tentando estacionar, mas estava toda atrapalhada, coitadinha. De repente Pezão se ofereceu pra ajudar. Parou atrás do carro e foi "guiando" a moça... "Vem pra cá" .. "Vai mais um pouquinho pra direita", e assim por diante. Nem preciso dizer o que aconteceu, né? Sim, a garota detonou o carro. Eu nunca vi o Pezão correr tanto como aquele dia. A garota desceu do carro e gritou tanto palavrão, mas tanto palavrão, que se ela estivesse no Big Brother você só ouviria um piiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii de 10 minutos, sem intervalos.

— Falando nisso, você já experimentou algum dia?

— Transar com mulher?

— Sim, já experimentou?

— Claro que já.

Maldito Jaime, foi abrindo as cortinas do meu quarto. Agora eu quase fiquei cego mesmo.

— Não gostou nem um pouquinho?

— Não muito. — ele até fez careta.

— Como é que pode isso? Santa Pixirica. Eu não consigo entender. Mulher é a coisa mais gostosa do mundo. Como é que você não gostou? Você deve ter catado uma mina muito horrível. Será que você não deu azar e catou a Lelê?

— Quem é Lelê?

— Ah, deixa pra lá.

— Sei lá, Nando, eu não gostei.

— Você vai me deculpar, primo, mas eu não consigo entender. Existem quatro coisas no mundo que eu não consigo entender.

Primo Jaime começou a rir.

— Quais?

— Número um, vocês, homens que não gostam de mulher. Número dois, pagodeiro rico. Como é que pode alguém fazer um negócio tão ridículo daquele e ficar rico? São geralmente seis babacas sobre um palco dando dois passinhos pra cá e dois passinhos pra lá. Eu não entendo.

Jaime quase passou mal de tanto rir. Parecia uma hiena com hemorróida.

— Quais as outras duas coisas? — perguntou ele, chorando de tanto rir.

— Número três: como o pinto do Pezão ficou verde se ele passou mostarda?

— Hã? Pezão? Pinto? Verde? Mostarda? Que é isso?

— Deixa pra lá, primo... é uma longa história.

— Tudo bem. Mas agora estou esperando pelo número quatro.

— Certo. Número quatro: como é que a Lois Lane não percebe que o Clark Kent é o Superman? Porra, a mulher é repórter, não é? Como é que ela pode ser tão tapada assim? Garanto que a Ana Paula Padrão desconfiaria, pelo menos. Eu não entendo.

— Puta merda, primo, você cheira um. Fala a verdade.

— Eu? Não. Quando eu quero ficar doidão eu tomo Fanta Uva com Caracu.

— O quê?

— Experimenta! Experimenta! Experimenta!

— Funciona mesmo?

— Se funciona? A última vez que eu tomei eu consegui me trancar dentro do meu próprio quarto.

— Puta merda, isso? Mas isso qualquer idiota faz, nem precisa estar chapado.

— Com a chave do lado de fora?

— Hã? Como você fez isso?

— Sei lá, cara. Sei lá. Só sei que o bagulho é louco.

Ficamos jogando conversa fora até uma hora da tarde. Depois almoçamos. Primo Jaime não largou do meu pé nem por um segundo. Putz! Que saco. O cara é gente boa, mas um veado me seguindo pra todo canto não é algo que eu pedi em minhas orações. E pra ser sincero eu até sou bem modesto nos meus pedidos. Geralmente peço mulher gostosa e um pouco de grana. Ah, um carrinho zero também seria bem-vindo. Porra, está me achando fútil? Eu tenho 18 anos e meu bilau endurece até com desenho animado, o que mais você quer que eu peça?

— Por quê você olha tanto para o relógio? — perguntou Jaime, sentado no sofá com as pernas cruzadas.

Devo mentir ou falar a verdade? Ah, dane-se...

— Hoje pode ser o primeiro encontro da banda.

Jaime ficou todo animadinho.

— É mesmo? Massa!

— Massa? Vocês gays não falam "Super" quando estão alegres?

— De onde você tirou isso?

— Esquece.

Na verdade eu ouvi no Southpark. Lembram do Al Gayzão? hahahaha.... Super!!!

— Mas diz aí, você não conhece os outros integrantes da banda?

— Conheço sim. Bom, só tem um que eu não conheço, o baixista. O cara é irmão da gostosa que dá aula de bateria pro Pezão.

— Pezão. Quem é Pezão? Você já mencionou este figura umas vinte vezes hoje.

— O Pezão é o maior filho-da-puta que eu já conheci. Ah, e é o meu melhor amigo.

— Deu pra perceber.

— A gente se conhece desde pirralho. Já passamos por muitas loucuras juntos. Você nem faz idéia.

Não teve outro jeito. Fui pra casa do Pezão e o primo Jaime veio junto, feito carrapato. Mas eu acho que ele já esqueceu aquele lance de tocar gaita. Espero que tenha esquecido mesmo. Não quero o Pezão me azucrinando por causa disso.