As Aventuras de Nando & Pezão

“O Pai da Magareth”

Capítulo 6 – A Tempestade

A cena estava engraçada. Pezão desviava dos golpes do gordinho, ria feito um doido, e ainda o provocava.

— Vamos, Pequeno Giz! Venha me pegar, Pequeno Giz!

— Parem com isso, vocês dois! — disse Margareth, num tom de voz mais calmo. — Saiam da chuva, vocês vão ficar resfriados! Está na hora do lanche.

A chuva apertou. E de repente já não era uma chuva qualquer, mas sim um temporal como poucas vezes eu vi na vida. Parecia que o mundo todo estava desabando em água. 

Corremos para dentro do restaurante.

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O lugar estava vazio. Não havia fregueses, muito menos garçons. Nada.

— Estranho — disse Margareth, olhando ao redor. — Não tem ninguém?

— Tô morrendo de fome! — disse o garoto, passando feito uma flecha gorda por nós.

— Aonde o senhor pensa que vai, hein?

— Procurar alguma coisa para comer.

— Volta aqui! Este lugar me dá arrepios.

— Quer saber? — disse eu, indo atrás do gordo. — Ele tem razão. Eu também vou procurar o que comer. Meu estômago já está dando piruleta.

Pezão fez a mesma coisa. Margareth ficou fula da vida com a gente.

— Oh, de casa! — gritei bem alto. — Tem alguém aí? Tem freguês com fome!

De repente, passando ao lado do balcão do caixa, ouvi gemidos. Posso até estar equivocado, mas creio que são gemidos de prazer. Tem gente trepando atrás do balcão. Pelo jeito que o Pezão olhou para mim, acho que ele também pensou a mesma coisa.

— O que foi? — perguntou Margareth para nós. Ela tinha dado apenas um passo para dentro do restaurante. Parecia amedrontada, só não sei exatamente com o quê. O lugar estava deserto, fora isso não havia nada de assustador.

Pezão apontou para o balcão, depois imitou a "Dança do Créu". Você sabe exatamente como é, não peça para eu descrevê-la.

— Safado! — disse Margareth, com as mãos na cintura. — Agora não!

Pezão começou a rir, balançando a cabeça.

Enquanto os dois tentavam se entender, eu aproveitei para espiar atrás do balcão. Meu, vocês não vão acreditar no que eu vi. Putz!

— Olá! — disse eu.

Havia um casal de anões fazendo um "69" selvagem. Nunca vi nada tão bizarro na minha vida. O anão estava por cima; sua minibunda cabeluda quase me fez vomitar. 

Quando notaram minha presença, ficaram super envergonhados. Pareciam dois pimentões fazendo sexo vegetal. Pezão esticou seu pescoção também. Aí eles passaram de envergonhados a irritados.

— Poderiam nos dar licença um minuto, porra? — disse o anão para nós.

— Não diga palavrão, querido! — disse a anã debaixo dele. Por um instante consegui ver sua minixoxota. Bom, para ser honesto não era tão "mini" assim.

Pezão e eu nos afastamos do balcão.

— Tem gente aí? — gritou Margareth.

— Tem — disse eu, rindo feito uma hiena brincando com um Pirocóptero na rua.

— Entra aqui, Ma! — disse Pezão. — Está com medo do quê, cacete?

— Sei lá, né? Este lugar me fez lembrar daquele filme Um Drink no Inferno.

— Falando em inferno, cadê o Pequeno Faustão? — disse eu.

— Pequeno Faustão é o corno do seu pai! — disse o gorducho, sentando-se numa das mesas, com um prato de pudim.

— Onde você pegou isso, Tim? — disse Margareth.

— No balcão de doces — respondeu ele, com a boca cheia. Depois ele disse algo que nenhum de nós conseguiu entender.

— E como você sabe que isso aí não está estragado?

Antes que o gordo peçonhento respondesse, ouvimos uma voz atrás de nós:

— Não está estragado, mocinha — disse a anã.

Todos nós viramos na direção do balcão. O minicasal, agora devidamente vestido, olhava para nós com um alto grau de desconfiança. Ambos possuem a mesma altura; um pouco mais de 1 metro. Ao vê-los, Margareth deixou escapar um riso, mas ao perceber que somente ela estava rindo, parou imediatamente.

— Desculpa — disse Margareth, envergonhada.

— Desculpa por quê? — disse o anão. — Por rir de nós ou por roubar nosso pudim?

— Calma aí, não roubamos nada! — disse eu.

— Então aquele pudim vocês trouxeram de casa, é?

— Pare com isso, Joca! — disse a anã, depois saltou do banco onde estava e veio até nós. — Deixa o garoto comer o pudim em paz.

A anã tem uma voz bonita e imponente, poderia muito bem trabalhar como locutora numa rádio. Não sou muito bom para adivinhar a idade das pessoas, principalmente de anões, mas eu diria que ela não tem mais que 30 anos. E é bonitinha, viu? Já o anão parece um filhote de Oompa-Loompa com um cachorro Chihuahua. E alguém esqueceu de dizer para ele que corte Mullet não se faz há muito tempo. Ridículo!

— Não somos ladrões — disse Margareth, irritada. — Vamos pagar pelo pudim.

— Não precisam — disse a anã. — É cortesia da casa. Além do mais, acabaria estragando se o garoto não o comesse.

Margareth estendeu a mão e cumprimentou a anã. O nome dela é Milena. Ela e o marido Joca são os proprietários do restaurante/hotel.

O minicasal nos serviu um café delicioso, com panquecas e uma pasta de amendoim como poucas vezes comi na vida.

— Acho que nunca comi tanto — disse Margareth para a anã. — A senhora fez tudo isso sozinha?

— Hoje sim — respondeu ela, sorridente. — Geralmente tenho a ajuda de outras duas cozinheiras.

— E onde elas estão?

— Demos folga para todos os funcionários. Hoje é feriado aqui em nossa cidade.

— Falando nisso — disse eu. — Que cidade é esta?

— Aqui é Cajupira, — respondeu Joca — a menor cidade do Brasil.

— A menor do Brasil? — disse o gordinho, antes de engolir um puta pedaço de panqueca.

— Sim, somos apenas 97 habitantes.

— O quê? — disse Margareth, espantada. — Noventa e sete?

— Novente e seis, querido — disse Milena para o marido. — Esqueceu que o compadre Nunes faleceu ontem?

— Sim, é verdade! Agora somos noventa e seis. Pobre compadre Nunes.

— Pensei que fosse a menor cidade em estatura — disse Pezão.

Margareth quase jantou o Pezão com os olhos. Vocês precisavam ver a cara que ela fez para ele.

— Isso também — completou Milena.

— Sério? — disse Margareth. — Então a cidade toda é ... ?

— Sim, somos todos anões.

— Tem alguma coisa errada — disse o gordinho. — A cidade dos anões fica no estado de Sergipe. E não podemos estar em Sergipe. Não viajamos tanto assim.

— A cidade dos anões é Cajupira, — disse Joca, sério. — e estamos em Minas Gerais.

— Ah, lembrei! O nome da cidade é Itabaianinha, isso mesmo!

— Você está enganado, garoto — disse o anão, bem irritado.

— Não estou.

Joca passou por mim e disse baixinho:

— Eu vou dar um cacete naquele gordo.

Comecei a rir sozinho. Ninguém entendeu nada.

Lá fora a tempestade come solta. Será que o mundo está acabando e esqueceram de nos avisar? Se esqueceram ou não, o que importa é que não há a menor possibilidade de pegarmos a estrada nestas condições.

Bom, pelo menos paramos no lugar certo, né? Afinal de contas o lugar é restaurante/HOTEL. Vamos ter que passar a noite por aqui mesmo.

— Perdão, por acaso você não teria uma camisa para me emprestar? — disse eu para Milena. — Esfriou bastante e perdi minha camiseta durante a viagem.

— Temos uma pequena sessão de Achados e Perdidos — disse ela, toda gentil. — Você nem imagina as coisas que esquecem nos quartos e até mesmo aqui no restaurante.

— Vem comigo — disse Joca. — Tem de tudo naquele lugar; de cueca a jaquetas de couro. Só não esquecem a cabeça porque está colada ao corpo.

— Tô com frio também — disse o gordinho. — Posso ir com vocês?

— Não sei se terei algo ... do seu tamanho — disse o anão, com má vontade.

E lá fomos nós até a sessão de Achados e Perdidos. Eu pensei que era apenas uma caixa de papelão, com um monte de porcarias velhas. Mas me enganei redondamente. Joca nos levou até um quartinho no andar superior, o lugar era quase do tamanho do meu quarto, repleto de quinquilharias. Havia de tudo ali dentro, desde peças de roupa a radinhos de pilha.

— Um Aquaplay! — disse o gordinho, pegando o objeto de uma prateleira.

— Aquaplay?

— Você nunca viu? Minha falecida irmã tinha um. É acachapante! Você enche de água e ...

— Coloca de volta, garoto — disse Joca.

— Deixa eu ficar com ele, deixa?

— Não. Coloca de volta na prateleira, por favor.

Fiquei com pena do gordo. Ele guardou o brinquedo onde estava, sem dizer uma palavra.

— Ali naquele baú tem algumas peças de roupa — disse Joca. — Podem pegar o que vocês quiserem — O anão olhou para o gordinho e completou a frase: — Só o que estiver naquele baú.

— Obrigado — falei.

— Vou preparar os quartos para vocês e seus amigos. Volto já.

E o anão deixou o quarto. Imediatamente o gordinho pegou o tal do Aquaplay.

— Será que tem alguma torneira aqui por perto? — disse ele, todo excitado.

— Meu, larga esta porra! Não percebeu que o Pit Bitoca não foi com a tua cara?

O gordinho começou a rir sem parar, parecia uma Orca se apresentando no SeaWorld.

— Você é foda, cara. Meio esquisito, mas é foda.

— Esquisito é você, porra! Agora largue este brinquedo idiota e procure alguma coisa para esconder esta sua pança de mamute.

Acreditem ou não, ele me obedeceu.

Abri o tal baú. Fiquei impressionado com o volume. Nem meu próprio guarda-roupa tem tanta coisa assim.

— Que cheiro é este? — disse o gordinho, fazendo careta.

— Não fui eu.

— Eu sei. É do baú. — o gordinho colocou as mãos no nariz.

— Caralho, você tem razão — falei. — Que porra de cheiro é este?

— Você fala muito palavrão, sabia?

— E daí, porra? Vai tomar no seu cu, gordinho peçonhento Zé Buceta do caralho!

— Isso é sinal de estresse. Você vai morrer cedo.

Bati 3 vezes na madeira do baú.

— Vou o caralho! Agora fica quieto e procura um lençol bem grande para cobrir esta barriga de elefante.

Fucei, fucei e acabei encontrando uma jaqueta de moletom. Deu para o gasto. Vesti imediatamente, estava fazendo muito frio. Já o gordinho parecia mais preocupado em explorar o restante do quarto.

— Olha o que eu achei! — disse ele, segurando um pinto de borracha.

— Meu, você sabe o que é isso? — perguntei.

— Lógico que eu sei, né? — e o gordinho deu uma cheirada no pinguelo.

— Puta que pariu! Eu não acredito que você fez isso!

— E faço de novo, ó! — e fez mesmo.

Meu, este moleque tem algum problema mental psicológico da cabeça.

— Você comeu cocô, porra? Joga isso fora!

— Eu só queria saber qual é o cheiro de uma ...

— Xana? Xoxota? Xereca? Xinxila? Prexeca? Periquita? Vagina? Boceta?

— Ahã. Eu sempre quis saber como é.

— Olha, vou jogar a real com você. Há umas bem cheirosas. Em compensação, tem umas que ... Puta que pariu! Sabe o cheiro daquele baú? — e apontei. O gordinho fez que sim com a cabeça. — Já tive uma namorada que a xereca dela tinha um cheiro parecido, só que mais azedo.

O gordinho deu outra cheirada no pinguelo de borracha.

— Meu, joga isso fora, porra! — gritei com ele. — Você ficou maluco, é?

— Tem um cheiro bom. Acho que a dona tinha uma ... xereca limpinha.

— Você está enganado — disse Joca. É tão pequenino que nós nem percebemos que ele havia retornado.

O gordinho ficou branco de susto. Mas não largou o pinguelo.

— Isso aí não tinha dona — disse o anão, sério. — Tinha DONO.

— O quê? — o gordinho começou a ficar verde.

— Isso aí pertencia a uma bicha enrustida que se hospedava no hotel de tempos em tempos. Se quiser pegar para você, tudo bem. O dono já morreu mesmo. E se me recordo bem, morreu com um negócio desse aí, enterrado no cu, até o talo.

Putz! O gordinho jogou o pinguelo longe. Coitado, está procurando uma torneira até agora. E garanto que não é pra brincar de Aquaplay.