As Aventuras de Nando & Pezão

“O Motel”

Capítulo 1 – Pedido de Ajuda

Prestem atenção na hora ... 2h32 da madrugada. Sexta para sábado.

Meu celular toca ... "A minha alma está armada e apontada para a cara ... "

Ah, antes que vocês estranhem, não estou cantarolando ... Apenas coloquei a música do Rappa no toque do meu celular. Chique, né?

Olho para o display e vejo o nome do filho-da-puta do Pezão. É lógico que eu não atendi. Voltei a dormir.

Menos de 10 segundos depois, o maldito celular voltou a tocar. Não atendi.

Ele tocou outra vez, é claro.

Eu já ia me preparando para desligar o celular, quando uma voz me disse para atender, pois poderia ser um caso de emergência. Calma, não foi nenhuma assombração ou coisa parecida, foi apenas o tal do sexto sentido. Esta porcaria raramente funciona a meu favor, mas ... Vamos ver no que dá.

Atendi o maldito celular:

— Fala, Pezão dos infernos! Perdeu o sono, seu porra?

— Por que demorou tanto pra atender, caralho?

— Você sabe que horas são?

— Sei. Meu, preciso da sua ajuda.

Lá vem bosta. Ninguém te liga às 2 e meia da madrugada para contar história da carochinha.

— Ajuda o cacete! Vou voltar a dormir.

— É sério, Nando! Quebra este galho, mano!

Fiquei em silêncio, tentando imaginar que tipo de ajuda ele precisa a esta hora da madrugada. Será que foi cagar a entalou o cu na privada? Será que foi abduzido por alienígenas? Será que ... ?

— Você está aí? — perguntou ele, com uma voz ligeiramente alterada.

— Anda logo com isso! — ouvi a voz da Margareth.

— A sua namorada está aí com você, não é? — perguntei apenas para mostrar que eu já estava ciente da presença dela.

— Sim, está. Nando, levanta dessa cama. Preciso da sua ajuda, porra!

— O que está acontecendo? Desembucha logo, caralho!

— Estou preso num motel. Quero dizer, estamos; a Ma e eu.

Putz!!! Presos num motel? Essa é nova.

— Presos? Como assim? Você perdeu a chave? Liga para a recepção e ...

— Não é isso, seu idiota! Na hora de pagar a conta eu descobri que estava sem a minha carteira. Agora não querem deixar a gente sair.

— Mas como você tem a moral de ir para o motel sem carteira, porra?

— Eu acho que perdi no cinema. Ou aquele maldito pipoqueiro me roubou!

— Que bosta.

— Você vai nos ajudar ou não? — era a voz da Margareth. Ela deve ter tomado o celular das mãos do Pezão. A mina é estouradinha.

— Depende.

— Depende do que, caramba?

— Só se vocês meterem na minha frente. Eu sempre tive vontade de ver e ...

— Sem problema! Mas vem logo!

— Calma aí, eu só estava brincando.

— Eu não.

E Margareth começou a rir feito uma hiena tirando cera do ouvido.

— Do que vocês estavam falando? — perguntou Pezão.

— Nada, Pezão, nada — falei.

— Vai tirar esta bunda gorda da cama ou não, porra?

— Você vai ficar me devendo esta, hein! E vou cobrar caro.

— Pára de frescura e vem logo!

Fazer o quê, né? Depois disso tudo eu acabei perdendo o sono mesmo. Levantei, passei uma água na cara, vesti uma calça e tirei o "podrão" da garagem.

Pois é, amigos, depois de tudo o que aconteceu no episódio anterior, meu Opala ficou conhecido como "podrão". O motivo? Aquele maldito cheiro de gente morta que grudou nele. Já mandei lavar em todos os lava-cars da região, mas não adianta. O mau cheiro até passa, mas depois de uma semana ele volta. É lógico que não volta com aquela mesma intensidade, mas ... lá no fundo dá pra sentir. Para ser bem honesto eu quase já não o sinto mais, mas quem entra nele pela primeira vez ... diz que é cruel.

Parte o meu coração ter que lhes contar isso, mas estou pensando seriamente em vendê-lo. Putz! Dói, meus amigos, dói na alma. Alguém se habilita? Faço precinho camarada.

Puta merda, só no meio do caminho eu me dei conta de uma coisa: O Pezão levou a biscate da Margareth no motel mais caro da cidade: o Bally-Bally. Esta porra de motel custa uma nota preta! Só fui lá uma vez até hoje. Estão pensando o quê? A suíte mais chulé não sai por menos de 200 paus! Mas vale a pena, dá até pra escolher um quarto temático. Na minha época tinha as suítes Hollywood, Medieval, Egito e outras que eu não me recordo o nome agora. Só sei que o bagulho era chique demais. Vem muito casal de fora para meter lá. Minha cidade pode ser um lixo, mas tem o melhor motel das redondezas. Em se tratando de foda a gente entende.

Resolvi encostar o carro e olhar a minha carteira. É melhor eu me certificar de que vou ter grana para pagar a conta, né? Já imaginaram o mico? — Eu vim pagar a conta do meu amigo. — "Certo, são 300 reais". — Hã? Fica para a próxima, moça, só tenho trintinha.

Quando comecei a contar o dinheiro, notei que alguém estacionara logo atrás do Opala. Era só o que me faltava ... a Polícia!

Dois policiais vieram pelas laterais do meu carro. Um deles fez sinal para eu descer o vidro. Fiz o que ele me pediu. Eles ficaram me observando como se eu fosse um fugitivo.

Bom, vejamos ... Um Opala preto encostado numa rua deserta, em plena madrugada, com o motorista segurando uma carteira e contando dinheiro. Preciso reconhecer que é bem suspeito mesmo. No lugar deles eu teria feito a mesma coisa.

— O que você faz aqui sozinho esta hora, rapaz? — perguntou um dos policiais, com uma das mãos sobre sua arma.

— Estou indo ajudar um amigo — disse eu, tentando não demonstrar nenhum nervosismo. Não sei se consegui. Dei uma engolida a seco.

— Se está indo ajudar um amigo, por que está parado aqui?

— Só parei para ver se estou com dinheiro suficiente na carteira.

— Posso vê-la? — ele fez uma pausa. — A carteira.

— Claro — e entreguei a carteira para o policial. Fiquei feliz por saber que minhas mãos não tremiam. Bom, e por que tremeriam, não é? Não tenho nada para esconder.

O policial pegou minha identidade e ficou comparando a foto comigo.

— A foto não se parece nada com você.

Como é que é?

— O corte de cabelo está um pouco diferente, mas sou eu.

O guarda ficou me encarando e olhando para o meu RG, alternadamente e, diga-se de passagem, irritantemente.

— Paulão, vem aqui — o policial que segurava o meu documento chamou o parceiro.

O outro veio imediatamente, e não desgrudou os olhos de cima de mim um único instante. Estou começando a ficar preocupado.

— O que foi? — perguntou o tal do Paulão. — e pegou o meu documento.

— O que você acha? É ele? — e o policial apontou para mim.

— Sei não — respondeu com a maior tranqüilidade. — O cara da foto é mais ... rechonchudo. Isso, rechonchudo.

— Eu era um pouco gordinho naquela época — disse eu.

— Você está achando graça nisso, rapaz? — disse o Paulão.

— Não, senhor. De jeito algum!

— O cara está zoando com a gente, você viu? — disse o Paulão para o outro policial.

— Não estou! — disse eu, bem nervoso.

O tal do Paulão deu dois passos longos e ficou de frente para o Opala.

— Você sabia que não pode circular com o farol quebrado? — disse ele.

Fiquei mudo. Não consegui falar uma só palavra.

— Responde! — disse o outro policial para mim.

— S ... S... Sim, eu sei, mas os meus faróis são novinhos e ...

SPLAFT!!! Foi só o que ouvi quando o filho-da-puta do policial meteu seu cassetete no meu farol esquerdo.

Puta que pariu!!! Vocês acreditam nisso? Fiquei totalmente sem reação, como se eu estivesse dentro de uma sala de cinema assistindo a um filme trash. Não dava para acreditar no que estava acontecendo.

— Vai, continua zombando da gente agora! — disse o outro policial, abrindo um sorriso largo e sacana.

De repente ouvi o rádio da viatura chamar os dois policiais. Eles foram chamados para uma ocorrência. O tal do Paulão puxou uma nota qualquer da minha carteira e colocou no seu bolso. Eu estava tão transtornado que nem vi o valor da nota. Depois ele jogou a carteira com força na minha direção, acertando em cheio a minha testa.

— Vai deixar ele ir embora? — perguntou o outro policial, correndo até a viatura.

— O cara está limpo. É o mesmo idiota da foto.

E ambos entraram na viatura às gargalhadas. Filhos da puta!

Antes que eu pudesse me recompor, eles pararam com a viatura do meu lado e me ameaçaram:

— E bico calado, Fernandinho! Ou a gente te acha, entendeu?

Não é hora para bancar o herói, certo? Fiz que sim com a cabeça e eles foram embora.

O Rappa começou a tocar no meu celular. Era o Pezão, lógico.

— O que foi? — atendi, revoltado com o mundo.

— Onde você está, porra?

— Onde eu estou? FODIDO!!! Isso, sim, estou FODIDO!!! Acabei de ser assaltado, humilhado, ameaçado, e para ajudar, estou só com o farol direito!!! Satisfeito, Pezão? Agora é melhor eu desligar, antes que aqueles filhos-da-puta voltem e levem o meu celular novo!!!

— Puta que pariu, o que aconteceu?

— Vai se foder você também! É tudo culpa sua!

E desliguei o celular.

Ajeitei-me no banco, respirei fundo, contei até dez e tentei me acalmar. Foi difícil, pois um ódio descomunal havia tomado conta de mim. Foi como se tudo o que acontecera de ruim comigo nos últimos anos tivesse vindo à tona naquele exato momento. Senti que iria explodir. Senti vontade de gritar e jogar tudo para fora.

Liguei o rádio. Quem canta, seus males espanta, certo?

Errado. Sintonizei uma rádio muito bizarra. Ao invés de música, tinha um cara falando sem parar. Falando não, berrando. E acreditem se quiser, a voz era muito familiar. Familiar até demais para o meu gosto ... era a voz daquele filho-da-puta do Mestre dos Magos. Lembram-se dele? Aposto que vocês lembram do Babalu Cósmico do caralho.

Não acredito que além de solto, o cuzão ainda tem um programa de rádio! Ah, ninguém merece. Só no Brasil mesmo.

É lógico que sintonizei outra rádio imediatamente. Agora sim! Offspring, com a música Keep'Em Separated. Bom sinal, sou viciado nesta música. Senti uma vontade imensa de colocar o volume no último, mas infelizmente o horário não me permite. Já passam das 3 horas da madrugada.

Um pouco mais calmo, procurei pela carteira. Ela estava caída sobre o meu colo. Havia um pouco mais de 200 reais. Duzentos e trinta e três, para ser mais exato.

Bom, se o Pezão não pegou a suíte mais fodona de todas, acho que dá para eu pagar.