As Aventuras de Nando & Pezão

“Mistério Misterioso”

Capítulo 12 – Guto e Cirilo 

— Mamãe está tão contente! — disse Camilla, rindo.

— Claro que está! — completou Isabella — Ela finalmente vai conhecer o Cirilo e o Guto, não é?

— Isso aí! 

E as duas irmãs caíram na gargalhada, como duas hienas num salão de cabeleireiros.

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Eu não levo o menor jeito pra bicha, nem de mentirinha!!!

— Essa parada aí não vai dar certo — falei, injuriado.

— Eu não quero ser pessimista — disse Isabella. — , mas para o bem de vocês dois, é bom que o plano funcione.

Camilla fez uma cara de preocupada, depois disse:

— Papai tem um ciúme tremendo de nós duas. Qualquer homem que se aproxima de nós, ele não enxerga como homem, mas como um inimigo.

— Mas esquecemos de um pequeno detalhe, mana — disse Isabella, atraindo olhares curiosos de nós três.

As gêmeas trocaram olhares por alguns segundos, como se estivessem se comunicando por telepatia.

— Ai meu Deus! — disse Camilla, bem assustada. — Como eu pude me esquecer disso?

— Do que vocês estão falando, caralho? — esbravejei.

Eu estava bem nervoso, admito.

— Como eu já disse, papai odeia qualquer homem que se aproxima de nós — disse Camilla.

— Sim, já entendemos — disse Zoinho.

— Mas esquecemos de dizer que papai também odeia gays — completou Isabella.

Porra, agora fodeu de vez.

— Acho melhor a gente pular a janela e dar no pé — falei, já me encaminhando para a janela.

— Fique à vontade — disse Isabella, ironicamente.

Olhei pela janela e vi que seria praticamente uma missão impossível descer por ali, a menos que eu fosse o Homem-Aranha. E que eu saiba, meu nome é Fernando, não Peter Parker.

Bom, parece que não tem outra solução. Fodeu.

Isabella desceu para preparar o terreno. Camilla não tirava os olhos de cima de mim.

— O que foi? — perguntei, irritado.

— Vocês não têm jeito de homossexuais.

Lógico que não, né? Eu sou é macho, porra!!!

— Pode tirar o cavalinho da chuva! — falei, já suspeitando do que Camilla tinha em mente. — Não vou usar nenhuma roupa sua ou da mana, muito menos usar maquiagem, entendeu?

— Nem eu!!! — concordou Zoinho, prontamente.

Camilla começou a rir.

— Como vocês são bobos!

— Se o seu pai não acreditar, foda-se! Saio correndo. Ele deve ser um senhor de idade mesmo, jamais me alcançaria e ...

— Papai já foi bi-campeão da Maratona do Guarujá. Tem um físico invejável para a idade dele. Vocês vão me desculpar, mas nenhum de vocês teria a menor chance contra ele. Papai faria picadinho de vocês.

Zoinho sentou-se na cama, bem nervoso.

— Estamos perdidos — disse ele, cabisbaixo. — Fui descolar o pior sogro do planeta.

— Calma, Zoinho — falei. — Vai dar tudo certo.

— Vocês poderiam pelo menos dar uma desmunhecadinha, não é? — disse Camilla.

Mostrei aquele famoso dedo para Camilla, é claro.

Dez minutos depois, Isabella voltou para o quarto.

— Está na hora — disse ela. — Vocês precisam descer. Papai já está ficando desconfiado demais.

Putz!!! Fodeu. Meu corpo inteirinho congelou.

— Espera! — disse Camilla, de repente. Tomei um puta susto.

— O que foi? — disse Isabella.

— Qual de vocês será o Guto e qual será o Cirilo?

— O Zoinho tem mais cara de Cirilo — falei.

— Cirilo o escambau! — resmungou Zoinho, puto. — Você é que tem cara de Cirilo!

— Cirilo é nome de baixinho, combina mais com você.

— Dane-se! Eu vou ser o Guto.

Notei que as irmãs estavam indignadas com a nossa discussão idiota.

— Vamos, continuem! — disse Isabella, irritadíssima. — Temos todo o tempo do mundo!

Fiquei com vergonha. Olhei para o Zoinho e falei:

— Vamos nessa, Guto.

Zoinho entendeu o espírito da coisa e respondeu no mesmo tom:

— Isso aí, Cirilo. Vamos lá.

— Que desmunhecada foi esta, Zoinho?

— Foi só para entrar no personagem.

Sei, sei ...

— Poxa vida, uma desmunhecadinha não fará mal algum — disse Camilla, esforçando-se para não rir das nossas caras.

— Ah, só uma coisinha! — disse Isabella. — Lembrem-se que vocês dois são namorados e moram juntos há cinco anos, e possuem uma loja de antigüidades em São Paulo.

— Puta que pariu — resmunguei, puto da vida. — Por que estas coisas só acontecem comigo? Será que eu joguei merda na cruz?

Eu já passei por muitas situações difíceis e embaraçosas nestes últimos tempos, vocês são testemunhas disso, mas ... esta realmente me pegou totalmente despreparado. Como eu já disse, eu não nasci pra ser veado!!! Até o meu lado gay é sapatão.

Descemos apavorados a escada. Eu nunca suei tanto em tão pouco tempo.

Sentados no sofá, estavam os pais das gêmeas. A mãe, uma coroa bonitona, acredito que não tenha mais do que 40 anos de idade; pele morena como as filhas, olhos tão azuis que me deixaram hipnotizado por alguns instantes. E agora o pai: um baita homenzarrão de 2 metros e mais alguns centímetros de altura, cabelo todo seboso de gel, olhos atentos de predador. Apesar da idade, o coroa tem um físico realmente de dar inveja. Camilla tinha razão, numa briga mano a mano, eu levaria uma surra do coroa.

Não tivemos nem tempo para sentirmos medo, pois a coroa veio com tudo para cima de nós. Lascou dois beijos no meu rosto e me deu um puta abraço apertado. Se o abraço durasse mais dois segundos eu teria uma baita ereção. A mulher é cheirosíssima e tem uns seios maravilhosos. As filhas herdaram os genes da mama, ainda bem.

— Você deve ser o Guto, acertei? — disse a mulher para mim, abrindo um sorrisão tão lindo quanto os das filhas.

— Não, senhora — respondi. Confesso que não me preocupei se tinha falado grosso demais ou não. Na hora eu nem me lembrei da porra do plano. — Eu sou o Cirilo.

— Mas você não tem cara de Cirilo! — e a coroa apontou para Zoinho. — Ele tem.

Todos olhamos para Zoinho. Fizemos um puta sacrifício para não rolarmos no chão, às gargalhadas.

— Eu sou o Guto — disse Zoinho, meio sem graça.

E a mulher deu um abraço ainda mais apertado no Zoinho. A mulher praticamente esfregou os peitos na cara do nosso amigo. Creio que se ela soubesse que não somos gays, jamais teria feito aquilo.

— Perdão, Guto — disse a mulher, vermelha de vergonha. — Bom, eu não preciso dizer o meu nome, é claro. Minhas filhotinhas lindas já devem ter falando muito sobre mim, não é?

Antes que Zoinho dissesse alguma bobagem, Isabella interveio.

— Convencida esta Dona Hermegilda, vocês não acham?

Putz!!! Hermegilda? Bom, é tão horrível quanto o nome do pai. E como é mesmo o nome do coroa assustador? Flatulêncio alguma coisa ... Sei lá! Bom, pelo menos as filhas receberam nomes decentes.

O pai das gêmeas estava olhando atentamente tudo o que se passava ali na sala. Olhos iguais aos de um falcão perseguindo uma lebre.

— Como vocês já devem imaginar — disse a coroa, dando alguns passos em direção ao homenzarrão assustador. — , este é o meu marido, Gaspar.

Isso! O nome do coroa é Flatulêncio Gaspar. Ainda bem que a mulher não disse ... "este é o meu marido Flatulêncio", caso contrário eu não sei se teria me controlado.

Estendi minha mão direita para cumprimentar o homenzarrão, mas ele limitou-se apenas a um aceno discreto. Será que ele acha que a veadagem é algo contagioso?

A mãe das gêmeas ficou claramente envergonhada com o ato frio do marido, mas limitou-se a ficar calada. Meu, aposto que o João Grandão bate na mulher. 

Ficou um silêncio constrangedor por alguns segundos, até que resolvi agir.

— Dona Hermegilda e Seu Gaspar — falei pausada e educamente. Ah, e não fiz voz de veado nem desmunhequei, viu? Sai fora! — Foi um prazer imenso conhecê-los, mas nós já estávamos de saída e ....

E a coroa gostosa deu um salto até a porta e deu duas voltas na chave.

— Nem pensem nisso! — disse ela, sorrindo. — Esperei anos para conhecê-los. Vocês não saem daqui tão cedo. Nem lhes preparei meu famoso cafezinho! — e ela olhou na direção das filhas. — Eles precisam experimentar o café da mama, vocês não acham?

— Sim, mamãe — responderam as irmãs, preocupadas.

A mulher literalmente nos arrastou para a cozinha. De certa forma eu me senti aliviado, pois acabamos nos livrando do sargentão com olhos de falcão. Aquele cara estava me dando nos nervos. A sensação que dava era a de que ele estava louco para pular no meu pescoço e me enforcar até a morte.

— Eu sempre quis conhecer rapazes assim como vocês — disse Dona Hermegilda, colocando a água para ferver.

— Não fala assim, mamãe! — disse Isabella. — Eles são absolutamente normais.

— Eu sei disso, meu anjo. O que eu quero dizer é que, vocês sabem, é diferente! Eu estou me sentindo tão à vontade, como se estivéssemos numa roda de mulheres aqui na cozinha, entendem?

Ela disse quatro porque Camilla não estava conosco. Ela ficara conversando com o pai lá na sala.

— Mas eles não são mulheres, mãe! — disse Isabella, rindo.

— E nem queremos ser — disse Zoinho.

Eu comecei a rir feito uma hiena num show do Ari Toledo.

— É verdade que em toda relação gay tem um que é o homem e outro ... ?

— Credo, mãe!!! — gritou Isabella, horrorizada. — Que pergunta mais ...

— Sou apenas curiosa, filha — e a coroa olhou para mim. — Vocês são quietos demais! Nas novelas os gays são bem mais animados e falastrões!

— Novela é novela, dona — respondi, secamente.

De repente Camilla entrou na cozinha, com uma cara bem animada. Alguma coisa boa aconteceu. Ela entrou toda sorridente e sussurrou algo no ouvido do Zoinho. Depois veio para perto de mim e falou algo também:

— O perigo já passou. Papai subiu para descansar da viagem.

Meu, vocês não imaginam a alegria que eu senti ao ouvir aquilo. Levantei-me e beijei as duas irmãs ... na boca!!!

— Ué, vocês não sentem nojo de mulher? — disse a coroa, espantada.

— Eu sou bi, Dona Hermegilda.

Isabella me olhou feio. Sua cara foi tão hilária que eu caí na gargalhada outra vez.

O meu desejo foi sair correndo daquela casa o mais rápido possível. Afinal de contas a dona sorte não bate à nossa porta duas vezes, não é? Se o João Grandão adormeceu, esta seria uma oportunidade de ouro para escaparmos!!!

O problema é que a Dona Hermegilda é um pé no saco. A mulher grudou em nós como carrapato. Obrigou-nos a tomar o seu maldito café.

E foi aí que eu me ferrei ...

O maldito café da Dona Hermegilda era a coisa mais doce e enjoativa que eu já tomei em toda a minha vida. Se eu fosse diabético, teria morrido ali mesmo na cozinha.

— O que acharam do meu cafezinho? — perguntou a mulher, toda orgulhosa. — É bom, não é?

Não tive nem tempo de responder porra alguma. Senti a maior dor de barriga de todos os tempos. Olhei apavorado para as irmãs e perguntei:

— Onde fica o banheiro mesmo? — eu estava quase cagando na cueca.

— Vá reto pela sala e vire à direita depois da escada — disse Isabella, apontando o caminho.

— Você vai ter que usar o banheiro lá de cima — respondeu Camilla. — Este aqui debaixo está com problema.

E Zoinho deu uma puta disfarçada. Foi ele que detonou o banheiro, é claro.

Porra, e agora? Não vou conseguir subir todos aqueles degraus com esta puta caganeira!!!

Mas não tenho outra escolha: ou arrisco e subo a escada ou vai voar merda por toda a cozinha. Resultado: saí correndo e vertendo lágrimas ... por todos os orifícios possíveis.

A cada degrau que eu subia, meu cu fazia uma ginástica incrível para não soltar o almoço numa estilingada só. Eu nunca pensei que subir uma escada com cagaço seria uma tarefa tão apavorante. Ainda bem que não tinha ninguém atrás de mim, pois teria morrido logo no terceiro degrau.

Depois de muito sacrifício, consegui vencer a escada! Nem acreditei.

Agora só falta o maldito corredor. Por que sempre colocam o banheiro no final do corredor? Maldito arquiteto filho da puta dos infernos!!!!!!!!!!!!

Bom, mas o corredor foi bemmmmm mais fácil do que subir aqueles degraus todos.

Entrei no banheiro e ... Aaaaaaaaaaaaaaaaahhhh!!!

Meu, que alívio ........... Foi como se eu tivesse retirado um alien de dentro de mim.

Dei umas quinhentas descargas e nada. Meu amigo alien não queria ir embora de jeito nenhum. Era inconcebível admitir que aquilo estivesse dentro de mim, minutos atrás.

Sinto muito, Camilla e Isabella, se este era o único banheiro sobrando, vocês estão perdidas ... Pois o bagulho vai ficar interditado por um bommmmmm tempo.

Saí do banheiro e dei de cara com quem?

É claro, dei de cara com o senhor-olhos-de-falcão. Ele mesmo, o pai das gêmeas, o João Grandão dos infernos.

Comecei a suar frio outra vez.

Ele não me disse nada, ficou me olhando com aqueles olhos assustadores.

— Acordei o senhor? — disse eu, apavorado.

Nada. Ele continuou me olhando.

— Que pergunta idiota, não? — prossegui. — É claro que acordei. Peço desculpas, não foi a minha intenção.

O cara continuou me olhando dos pés a cabeça. Eu sinto que ele quer me matar.

Um puta mau cheiro começou a sair do banheiro. Puxei a maçaneta e fechei a porta.

— O almoço não me fez muito bem e ...

Puta merda!!! O cara está vindo pra cima de mim. Pulei para a esquerda e ele fechou a minha passagem com o braço direito. Pulei para a esquerda e ele me fechou com o braço direito. O que eu faço? O cara é grande demais!

— Fique calmo — disse ele, com uma puta voz de trovão, parecia um arroto.

— O que você quer comigo? Não fiz nenhum mal para suas filhas, eu juro!!!

O grandalhão olhou para os lados e, quando viu que estávamos a sós, disse:

— Eu queria experimentar algo novo.

Como é que é?

— Não entendi.

E o filho da puta tentou me dar um beijo.

Puuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuuta que pariu!!!

Agora entendi o que ele quis dizer. Sai pra lá, João Grandão queima-rosca dos infernos!!! Comigo não, violão!!!

Meu, não pensei duas vezes: dei-lhe um puta chute no saco. O grandalhão caiu duro no chão, gritando feito um louco.

Saí correndo pelo corredor e desci a escada feito um foguete. Nem pareceu ser a mesma escada que eu subira minutos atrás, tamanha foi a diferença de tempo que levei para percorrê-la.

Quando cheguei na sala, estava todo mundo ali me olhando com olhos esbugalhados.

— Que estrondo foi aquele? — perguntou Camilla, assustada.

— Seu pai tentou me agarrar, então eu ...

— O quê? — gritou Dona Hermegilda. — O meu marido tentou o quê?

De repente ouvi passos lá em cima. O grandalhão já se recuperou. Puta merda!!!!

— Eu vou matar vocês dois, seus viados desgraçados!!! — gritou o João Grandão lá em cima.

Puxei Zoinho pelo braço, dizendo:

— Se você quer viver, vem comigo!!!

Zoinho ficou branco.

Saltei até a porta da sala, girando a chave desesperadamente. 

— Aonde vocês vão? — disse Isabella, apavorada.

— Qualquer lugar bem longe daqui!!!! — respondi, tremendo dos pés a cabeça.

E saí correndo desesperado até o portão. Zoinho veio logo atrás.

Entramos rapidamente no Opala, nem arrisquei olhar para trás. Pisei fundo no acelerador e saí queimando os pneus.

O destino? Sei lá!!! Qualquer lugar bem longe daquela casa!!!